Outro dia, eu teria um
encontro com uma conhecida. Na ocasião, participaríamos de um debate sobre
determinada obra. Eu a aguardava, pois meu intento era saber sua opinião a
respeito daquele livro. Meia hora antes, ela compartilhara no Instagram
que a leitura fora “concluída com sucesso” e o quanto estava impactada pelo que
leu. Minha expectativa só aumentava. Mais tarde, ao encontrarmo-nos, pergunto sobre
suas impressões a respeito da leitura, ao que ela responde:
- Nem peguei no livro,
acredita? Minha semana foi tão corrida...
A expressão que fiz naquele momento
não poderia ser outra: arregalei os olhos, surpresa, e a respondi só em
pensamento.
Em outra situação, um amigo
posta nas redes sociais o quanto está aproveitando sua longa viagem a um desses
lugares caros e badalados, para onde vão as celebridades. Havíamos nos
encontrado na noite anterior, quando ele me contara sobre sua estadia de duas
noites e três dias nesse destino, tendo retornado há mais de duas semanas.
***
Uma comerciante da cidade revela
que está investindo no segmento de “mesa posta”. Exclamei!!! Segundo ela, está
na moda preparar refeições para fotografar e publicar nas redes.
***
Uma conhecida do ambiente
virtual que lê, escreve, toca e fotografa, todas essas atividades com especial
esmero, compartilha uma ou outra inspiração com a mesma frequência que presenciamos
um cometa rasgar o céu. Não lembro a última vez que vi um cometa. Numa rara
postagem, ela relata sua total falta de afinidade com redes sociais. Penso:
- Que desperdício!
***
As quatro histórias contadas
andam reforçando meu caráter cada vez mais reservado, fazendo-me distante
dessas, que chamam de redes sociais. Não quero ser ranzinza, tampouco careta. De
caretice já basta a do mundo, que ficou um tanto pior depois que as cortinas se
fecharam pela última vez para o dramaturgo Zé Celso Martinez, essa semana. Mas esse
não é o assunto de agora. O que quero dizer é da dificuldade para engolir essa
conversa de que as redes são mesmo sociais. Tenho para mim que elas, as redes, estão
mais para artificiais. Já há quem as chame de quarto poder da democracia, dado seu alto poder de moldar comportamentos. Casais que sentam à mesa e nem se olham, distraídos pelo
celular; pessoas que viajam e esquecem de curtir a paisagem, preocupadas em publicar
selfies de cinco em cinco minutos; gente que papeia por horas pelo
aplicativo de mensagens, mas desvia o olhar quando se encontra na rua; e os
influenciadores são um caso à parte: muito influenciador para pouca influência.
Sem falar nas expressões da moda: “porque eu sou dessas”; “o queridinho”; “quem
me conhece sabe”; “é sexta-feira que chama?”, “é sobre isso”.
A vida anônima tem se
revelado muito mais profícua. Imagina, que loucura comer segurando só o talher
e não o celular! Fazer as melhores declarações de amor apenas para quem vai recebe-las.
Nem suspeitar qual foi a última polêmica em que aquele jogador de futebol se
envolveu. Curtir um passeio sem precisar alardear para os quatro cantos. Encontrar
bons amigos e conversar olhando nos olhos, sem verificar o celular compulsivamente...
além do que, a internet está repleta de disputas mesquinhas, mendigos de curtidas,
gente doida por aplauso, mas que não sabe aplaudir.
Gabrielly Frutuoso é
comunicadora.
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