quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Quando morre um poeta, todos choram

Antonio Cícero - Foto: Bárbara Lopes

Por Gabrielly Frutuoso

Tomou-me de assalto a triste notícia da morte de Antonio Cícero, formidável compositor, filósofo e poeta. Esta é a primeira semana do mundo sem a claridade de seu pensamento. O imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) subiu aos céus, muito embora ele mesmo não cresse nisso, sendo, pois, ateu. No exato segundo em que meus olhos se depararam com a manchete do jornal, fui consumida por um estranho vazio e um silencio sufocante, como se tivesse perdido um estimado amigo, um velho conhecido. Não deixa de ser. “Quando morre um poeta, todos choram”, diz o samba de Nelson Cavaquinho.

Nos dias que antecederam tal fato, estive obcecadamente debruçada sobre seus artigos publicados na Revista Brasileira, periódico da ABL, bem como em seu blog ‘Acontecimentos’, sem conseguir parar de ler. No entanto, minha relação com o erudito poeta, mágico das palavras, começou bem antes disso, já que era ele o nome por trás das canções de sua irmã, Marina Lima, que foram pano de fundo de muitas noites.
 
“O amor são fogos que se acendem sem artifícios.”

(O lado quente do ser – Antonio Cícero/Marina Lima)

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Notas sobre o Capitão Jagunço


Por Bruno Paulino

A primeira vez que ouvi falar sobre o personagem Capitão Jagunço foi através da música homônima de Luiz Gonzaga (Paulo Dantas e Barbosa Lessa):

 

“Capitão Jagunço/

 Eu gosto de furdunço/

Tem Canudos, por guia das tropas/

 Jogando irmãos contra irmãos”.

 

A composição marca na minha memória, sobretudo, pelo reiterado refrão:

 

“Não é mentira não/

Não é mentira não/

Conselheiro se julgava/

 O Messias do sertão”.

 

Só depois o reencontrei nas páginas célebres de Os Sertões, onde é citado por Euclides Cunha, em dois ou três capítulos:

terça-feira, 22 de outubro de 2024

Quixeramobiense ou Quixeramobinense: existe forma correta do gentílico?


Por Gabrielly Frutuoso

Sempre que se usa o gentílico para adjetivar os  nascidos em Quixeramobim, verifica-se certa confusão quanto à grafia e pronúncia do termo. A dúvida se dá entre as formas ‘quixeramobinense’ (com -n) e ‘quixeramobiense’ (sem -n). Outros municípios vivem o mesmo dilema da incerteza sobre seu adjetivo pátrio mais adequado, caso de Camocim, Ipaumirim e Jardim, para citar os mais próximos. Para esclarecer a questão, visitei obstinadamente importantes fontes do mundo acadêmico e literário.

Em rápida pesquisa em torno dos sufixos existentes na língua portuguesa, de pronto constatamos que a forma -nense não existe, mas apenas a forma -ense, sem o -n inicial. Mesmo assim, não é raro se deparar com o uso das duas formas – quixeramobinense e quixeramobiense – em correspondências e discursos oficiais no município, questão sobre a qual não há consenso, nem consolidação de uma forma padrão. Obras consagradas também registram as duas formas do gentílico. Em “Quixeramobim – Recompondo a História”, o mais completo documento histórico do município, o professor e historiador Marum Simão faz uso das duas grafias.

Outro intelectual de Quixeramobim, o professor, historiador e genealogista Fernando Câmara preferia a grafia ‘quixeramobiense’ em seus textos, tal como João Saraiva Leão, seu colega no Instituto do Ceará, que também optara pela mesma forma.

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Do cometa ao relógio


Por Eduardo Coutinho

É difícil definir o que é o tempo. Vivemos eternamente no presente, criando o passado e esperando o futuro. Essa é a maneira mais intuitiva de descrevê-lo. Durante toda a história da humanidade, religião, filosofia e ciência tentaram elaborar um conceito preciso para ele e até hoje, se alguém pedir para que se diga em palavras o que é o tempo, uma dificuldade imensa se apresentará.

Às vezes, quando a linguagem falha, podemos recorrer às sensações, porque, na experiência, muito do que é percebido concerne ao indefinível. E o tempo para mim é assim, mais sentido do que dito. Quando leio uma notícia de um fato ocorrido há décadas, de certa forma me conecto com aquela época. Imaginando-a agora, ela passa a existir novamente.

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Guardião de memórias: Eduardo Coutinho fala do livro de estreia e da paixão por antiguidades

Eduardo Coutinho

Eduardo Coutinho é um servidor público apaixonado por antiguidades e pelas artes. Colecionador de fotografias e objetos raros que contam sobre o Quixeramobim do passado, escritor sensível e de aguçado senso descritivo, artista plástico disciplinado, interessado em filosofia... a lista de atividades a que se dedica é longa. “Inquieto” talvez seja um bom adjetivo para esse jovem desbravador. E dessa inquietude tem resultado uma vasta produção nos últimos anos, incluindo a criação, em 2020, do Instituto Quixeramobim Histórico, projeto que toca ao lado da mãe, a professora de artes Ludmila do Rêgo, que conta com um acervo sem-número de fotografias e outros objetos de valor histórico. A ideia deu tão certo que o Quixeramobim Histórico acabou virando a principal referência quando se fala em museu digital na região, tendo realizado exposições próprias e contribuído com seu acervo para outros curadores.

Nosso guardião de memórias, em fevereiro deste ano, também lançou seu primeiro livro. E a trama não poderia ser outra, senão um romance histórico que se passa na Quixeramobim do início do século XX. Nas 102 páginas de “Eulália”, Eduardo Coutinho desenvolve uma história inusitada e envolvente, daquelas de ler devorando.

Em entrevista à Academia Quixeramobiense de Letras, Ciências e Artes (AQUILETRAS), o autor fala de suas facetas, que o levam a transitar por diferentes formas de expressão. O bate-papo é conduzido pela acadêmica Gabrielly Frutuoso.

quarta-feira, 21 de agosto de 2024

ENTREVISTA: livro de Marum Simão terá 2ª edição - João Bosco Fernandes está a frente do projeto

Quixeramobim - Recompondo a História
1ª edição, 1996

A redação da Academia Quixeramobinense de Letras, Ciências e Artes (Aquiletras) entrevistou o seu membro-fundador, Prof. João Bosco Fernandes Mendes, ocupante da cadeira nº 1, cujo patrono é o escritor Manuel de Oliveira Paiva, autor da lendária obra ‘Dona Guidinha do Poço’. Na pauta está a reedição e ampliação do livro ‘Quixeramobim – Recompondo a História’, de autoria do também acadêmico Marum Simão (em memória). A obra teve a primeira edição lançada em 1996. Há alguns anos, Simão vinha trabalhando para lançar uma segunda edição, no entanto, sua morte, em julho de 2023, abortou esse plano. João Bosco Fernandes Mendes, amigo de longa data e parceiro de pesquisa, assumiu o projeto.

‘Quixeramobim – Recompondo a História’ consolidou-se como um dos mais importantes documentos históricos do município. À época de seu lançamento, foi impressa uma tiragem de mil exemplares, que rapidamente foi esgotada, tamanho o relevo da pesquisa de Simão. Hoje, até mesmo em sebos e lojas de raridades é difícil encontrá-la.

Nesta entrevista, conduzida pela acadêmica Gabrielly Frutuoso, Diretora de Relações Públicas e Publicidades da Aquiletras, João Bosco Fernandes revela informações sobre o andamento da obra, fala da relação de amizade com Marum Simão e menciona outras importantes obras para conhecer a história de Quixeramobim.

quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Um Museu de Pessoas

Dona Mundinha e Sr. Harding
Arquivo: Quixeramobim Histórico

Devido ao meu trabalho com pesquisas e à tentativa de descobrir mais sobre o passado e a história de Quixeramobim, já visitei uma quantidade significativa de pessoas e famílias. Gente que me recebe em suas casas e abre suas portas para mostrar o que há de mais preservado em suas intimidades. E isso é, de certa forma, um estranhamento. Encontrar pessoas até então desconhecidas e, de repente, adentrar nas suas melhores lembranças me fez refletir sobre os sentimentos que carregamos ao longo da vida, em especial aqueles que resistem protegidos do esquecimento.

Mas o que é que elas me mostram, afinal? Geralmente, após uma breve apresentação de quem sou e do meu trabalho, a pessoa pede alguns minutinhos, desaparece por um cômodo mais afastado numa caminhada esquecida e, em seguida, volta com uma caixa empoeirada, ou com uma pasta amassada e já desbotada, que logo denuncia a sua antiguidade. Na mesa da sala, ela vai espalhando os registros e começa a mostrar as fotografias, quase sempre em preto e branco. Fotos da infância na calçada da casa que já não existe mais, das férias com os primos que foram morar distante e nunca mais se viram, ou da primeira comunhão com um padre que já morreu. Retratos de festas de carnaval com fantasias são comuns. “Olha esse vestido, que lindo!”. Uma pose do dia da formatura no colégio agora é difícil de ver por causa das manchas no papel. Narra as histórias olhando para algum ponto no horizonte, com um leve sorriso no rosto. Parece estar vivendo aquele prazer novamente. Ela sopra a poeira da foto e limpa delicadamente com o dedo. O passado tão próximo.